Durante sua vida, uma empresa poderá receber investimentos de diversos players e, ainda, ceder participação a diversos colaboradores estratégicos [1], tornando essencial que os founders tenham controle rigoroso dos níveis de comprometimento de equity da sociedade para que não sejam negativamente surpreendidos no futuro. Esse controle é feito pela gestão do cap table.
É comum que os founders sejam os únicos sócios no momento da constituição de uma empresa [2], de modo que, nesse estágio, basta analisar o contrato social da sociedade para saber seu cap table [3]. No entanto, à medida que a startup evolui e decide seguir a rota de venture capital, passando a captar recursos em rodadas de investimentos e outorgar opções de compra a colaboradores chave, haverá uma segregação entre o que está formalmente registrado nos documentos societários e a real distribuição da participação societária.
Isso acontece porque geralmente os contratos de investimento e de opção de compra preveem que a efetiva conversão em participação societária poderá acontecer posteriormente. Dessa forma, ainda que, formalmente, os fundadores possuam 100% de participação da sociedade, outras pessoas podem deter direitos sobre as participações societárias de emissão daquela sociedade.
É nesse contexto que a confecção e gestão de cap table se mostra um recurso fundamental, pois ele permitirá demonstrar o quadro societário final da sociedade, considerando que todas as pessoas que têm direito de subscrever ou comprar participações societárias efetivamente exerceram esses direitos. É o que chamamos de capital social em “bases totalmente diluídas”, ou seja, bases que consideram a eventual conversão de todos os instrumentos que transacionaram equity da sociedade.
Além de indicar quem são todos os shareholders em bases totalmente diluídas, um cap table inteligente tem como objetivo demonstrar o valuation da sociedade em cada rodada. Essa informação permite avaliar a saúde financeira do negócio para os sócios e investidores e se as diluições estão ocorrendo de forma benéfica (ou não) ao patrimônio dessas pessoas.
O controle do cap table também permite planejar estratégias para as próximas captações de investimento, pois, caso o quadro societário esteja “poluído” [4] ou os founders estejam excessivamente diluídos [5], poderá ser necessário tomar medidas como a utilização de parte do aporte para a recompra de investidores/colaboradores antigos e a outorga de mais equity aos founders.
Além das captações, é comum que o planejamento de cap table em startups considere um pool reservado para a outorga de opções de compra para colaboradores estratégicos. Inclusive, alguns fundos de investimento exigem que a startup renove o pool a cada nova rodada de investimento.
O descontrole no gerenciamento do cap table pode fazer com o que o founder não perceba a sua diluição e, por consequência, perca o controle político sobre a sociedade antes do esperado, tornando-se tese desinteressante para investidores. Em casos mais graves, pode acontecer de o fundador negociar equity sobre o qual não mais possui titularidade.
Portanto, é fundamental que os fundadores mantenham o cap table de sua empresa organizado e atualizado desde o momento de sua constituição. Investidores certamente solicitarão esse controle durante a diligência para aportar investimentos na startup.
[1] Principalmente se estivermos nos referindo às empresas que seguem a trilha de venture capital ou às companhias listadas em bolsa.
[2] Pode ser que operação já conte com seus primeiros investidores desde a sua constituição, os chamados Family, Friends and Fools (FFF), já tratados no artigo sobre a jornada das startups <https://www.linkedin.com/pulse/jornada-da-startup-onde-entram-os-investimentos-dcom-law/?trackingId=YW6vrdySuPMriOycBse2HQ%3D%3D>, ou até mesmo investidores anjo institucionais, caso estejamos falando de founders já conhecidos no mercado.
[3] Ou, no caso de sociedades anônimas, bastará consultar o Livro de Registro de Ações Nominativas. Entretanto, não é comum que pequenos empreendimentos sejam inicialmente constituídos como sociedades anônimas, mas sim como sociedades empresárias limitadas.
[4] Significa a parcela das participações societárias da sociedade pertencente a pessoas que não contribuem (ou deixaram de contribuir, por qualquer motivo) com o seu desenvolvimento, como colaboradores donos de opções de compra que já se desligaram da operação.
[5] A diluição em excesso das posições dos founders podem causar desmotivação, uma vez que o retorno financeiro em uma eventual venda da operação pode não fazer sentido se comparada à carga de trabalho e ao nível de responsabilidade que se sujeitaram. A desmotivação do founders, que, em tese, são as pessoas mais importantes para a operação, está diretamente ligada ao insucesso do empreendimento.